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quarta-feira, 7 de setembro de 2016

A craseado?

A CRASEADO?

É grave o acento do amor, indicando uma crase de aleluias. Dois que não são um mais um; dois corpos como as duas pancadas do relógio indicando uma única hora, a hora de acordar da sesta madrilenha; dois ás de copas, na medicina; dois ás de espadas, na alegria; dois ás de paus, a passeio; dois ás de ouro, em noites de São João. Quem, de outra forma, acentua o amor, não o conjuga bem, nem compreende o que é pronunciado.
O amor é crase que não obedece às normas; fulmina a gramática dos que conhecem o acento, mas não experimentam o fenômeno da pele. Amor em tons agudos e graves, conforme a destilação; em notas ofegantes, repetidamente ensaiadas, prolongadas no último canto de perenidade, quando o erudito e o popular se entregam ao sagrado êxtase. Triste amor, quando a crase é desfeita e cada qual dos ases volta para seu naipe, um esquecido do porre que deu no curinga, o outro mentindo para si mesmo que não gostou de ter aprendido a arte de gravear.
Preposição e artigo, unidos em forma de igualdade. O artigo, substantivo masculino, que pode ser ele ou ela, sem erro, tampouco nenhuma pornografia. A preposição, substantivo feminino, que prepucia a crase e faz as relações intensas, sem regidos nem regentes, entregues à unidade, na diversidade. Diálogos que se estabelecem entre Camões e Cervantes, na crase horizontal de céu e terra, onde os lábios de aqui se encontram com os lábios de aí.
Quatro mãos em crase, nas fogueiras que inquisicionam a solidão. Olhos em crase, mergulhados no gótico que assistiu ao nosso matrimônio. Pés em crase, na readequação dos nossos ventrículos. Primeira e segunda voz, crase polifônica de compassos geográficos distintos, sob a pausa de serras metrificadas pela liberdade de quem solfeja a palavra, ao ouvido faminto da língua. Nòs (sic!), crase em primeira pessoa, indicando um eu que sonha e um tu que desenha o acento, no tamanho da liberdade.

@gleiberdantas – Florânia, 07 de setembro de 2016.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

NÃO SEI POR QUE NASCI




NÃO SEI POR QUE NASCI
Sinto chegar-me, enfim, mais um agosto
no calendário frio da existência;
as rugas que descubro no meu rosto
são marcas de pesar por tua ausência!
Busco sentir, ainda, toda essência
dos beijos que te dei, o doce gosto
do batom perturbando a transparência 
do lenço, onde pranteio o meu desgosto...
Este passado preso à minha mente
só me deprime, só me faz descrente
do amor, da paz, de tudo que perdi!
Nesta data eu reflito e questiono
a razão de uma vida de abandono:
eu já nem sei, sequer, por que nasci!
   Eraldo Gomes de Oliveira

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Viver é caminhar



VIVER É CAMINHAR
Viver é caminhar. No início, você traça sua rota e prefere caminhar sozinho. Até que consegue chegar mais longe do que pensava, no primeiro dia. No dia seguinte, bate mais uma meta e vai além do que estava em seus planos. No terceiro dia, quando você ainda é o melhor expectador de si próprio, consegue ainda se surpreender, e assim se passam os dias. Você é você, e isto lhe basta. Com mais uma ou duas luas, você estranha como é que tudo mudou rapidamente. Caminhar sozinho é mais fácil porque lhe dá uma certa independência, a liberdade de poder fazer como bem quiser sua estrada, de dosar o seu passo conforme seus critérios, mesmo assim você começa a entender que solidão não é estar sozinho, é não estar em paz consigo. Compreende também que a vida é um aprendizado permanente e que o aprendizado se dá com a experiência de quem caminha com os pés, não de quem caminha com planos, cheio de sonhos, esgotado de vontade.
Você vai caminhando e entendendo que apenas seus rastros não fazem o caminho. Abre-se, então, para você novas possibilidades. Seu coração já não está vazio de si mesmo, como quando você iniciou sua trajetória e se fez medida absoluta, dizendo que quem quiser caminhar com você tem que acompanhar seu ritmo. O melhor ritmo é o ritmo do amor. Como disse um amigo, quem aprendeu a ser todo, não quer ser metade nunca mais.
Enquanto você caminha, experimenta o cansaço que você desdenhava nos andejos. Caminhar não para competir, caminhar para aprender. Caminhar para aprender como se ama, pois uma noite de amor não é todo o amor. É o sol que retira o excesso, é ele que sedimenta as verdades, encarregando-se de dar sentido ao suor que ele extrai, enquanto nós vamos cortando caminho. Quem começou sozinho, inteiro no orgulho, espinhoso demais para um abraço, vai amar o sol como nunca o tenha amado. Vai querer seu calor nas noites frias. O sol não é distante e ele sabe nos segurar dentro da vida. Viver é caminhar e o amor é a rota do caminho.
@gleiberdantas – Florânia, 16 de agosto de 2016.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

NOS ALPENDRES DA SAUDADE

NOS ALPENDRES DA SAUDADE

Por essa época do ano, reuniam-se todos os netos. Estávamos de férias e o ponto de encontro era a casa de meus avós, onde ficavam hospedados os netos que vinham de fora. Vovó fazia doce para todos nós. Os que não podiam passar os dez dias com vovó, vinham nos dois fins de semana. Quando eu nasci, meu avô já havia falecido, mas até hoje ele é o morto mais vivo que eu conheci. Vovó o amava tanto e tanto lhe agradava que, quando estávamos em nossas traquinagens, ela ainda usava da autoridade dele para nos colocar na linha. Poucos foram os primos que desfrutaram dele e eu gostaria demais de ter sido um destes. Dizem que vovô foi muito rigoroso com os filhos, tanto que estes quase não o reconheciam quando o viam, outra vez menino, brincando com os netos: meu avô, de quatro, levando os netos no lombo, brincando de cavalinho. Antes de falar sobre vovô, quando perguntávamos a vovó quem era ele, ela ficava em silêncio, suspirava um pouco e sempre dizia: é o grande amor da minha vida.
Também não alcancei mais vovó morando no sítio. Aqui, na cidade, a casa era toda de alpendre, para as conversas da noite, para os campeonatos de corrida, durante o dia. Cabiam umas dez redes. Ora dez, umas vinte. Mas a parte da casa que mais amávamos era o quarto do muro, onde estava tudo o que era de meu avô. Era uma mistura de museu, armazém, oficina, depósito de bugigangas. O que precisava de conserto tinha que ficar antes ali, mesmo vovô não estando mais ali para consertar.
Tanto vovó quanto vovô eram filhos da agricultura e da pecuária, nascidos aqui mesmo, filhos das raízes mais velhas da nossa terra. Ela era professora, embora não tivesse feito o Curso Normal, pois, quando pensou em sair para a capital, meu avô desatou no choro. Foi a única vez que vovó o viu chorar. Ela não aguentou e ficou para sempre ao lado dele. Como é bom saber que uma história de amor existe tão perto e tão dentro de nós, nascida de um olhar que soube ser fiel. E estamos indo no mesmo caminho...

@gleiberdantas – Caicó, 22 de julho de 2016.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Poeta como você

POETA COMO VOCÊ

Sou tão poeta quanto você pode ser, se ainda não é. A vida se manifesta a todos nós; alguns, é que a tomam como uma indireta, recebem-na como de mau humor e não sabem acolher a vida, se estiver ainda com seus defeitos e impotências. A verdade da vida é também a poesia que ela guarda. A poesia não é uma ilusão, é um desafio fora do comum. A poesia sabe acolher os bastardos. Ela exige que você se disponha a ver, simplesmente. Você pode dizer que ver todos querem, e eu digo que queremos ver o que nos agrada tão só. A poesia não se deixa dominar, ela é uma passagem secreta da vida. Muitas pessoas incriminam a poesia como sendo uma manifestação humana de segunda categoria, apenas porque não aceitam a denúncia que a poesia proclama, isto é, a poesia não se faz à base de dinheiro. Ninguém reduza poesia à rima, porque a poesia se manifesta como bem entender. Há pessoas que parecem não ter nada a ver uma com a outra e formam uma rima perfeita, embora sejam, em sua forma, dissonantes.
Poetas são seres humanos que têm alma de poesia, uma alma de olhos abertos e ouvidos atentos a escutar o que não foi dito. Poeta é um porta-voz de sentimentos que, às vezes, nem seus são, é um delator de si mesmo. O poeta não tem, necessariamente, que ser escritor. A sensibilidade todos possuem, uns mais aguçada que outros, sendo que nem todos aceitam receber o batismo da poesia. A poesia tem o poder de tornar leve o que ainda é pesado de ser sentido, mas esse poder ela entrega somente a quem enfrenta a dor.
Quem é que não pode ser poeta? Quem condenou o amor ao degredo. A poesia, antes de ser palavra, é pensamento, é um estilo de viver, é uma possibilidade a mais, que acaba ganhando todas as apostas que fizermos com ela. É a poesia que preenche o vazio de uma ausência e mantém sempre verde o caminho pelo qual há muito não se anda. É de poesia que bem se pode chamar cada dia de nossa vida.

@gleiberdantas – Florânia, 15 de julho de 2016.

quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Pai nosso Xukuru



wacine taiphu clarua nobi


Pai nosso que esta no céu 

Tiana piracini sekre

venha ao teu reino 

badzepi piracini taka

Seja feita a tua vontade 

lemolaigo e clarua nobi, 

Assim na terra como no céu 

Brende-poo no kringó clarin, clarin, 

Obrigado pela comida de cada dia 

Proxika wacini jatsamen

abençoa o nosso povo 

Piraci abrera ñago va waci badze arago no xiurinja

Prende esse mal que no faz erra contra o irmão 

waci taka Piracini yuaka

queremos o teu amor

no pirara clarin-yá

Para sempre 

vabatzepi

amen

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