É grave o acento do amor, indicando uma crase de aleluias. Dois que não são um mais um; dois corpos como as duas pancadas do relógio indicando uma única hora, a hora de acordar da sesta madrilenha; dois ás de copas, na medicina; dois ás de espadas, na alegria; dois ás de paus, a passeio; dois ás de ouro, em noites de São João. Quem, de outra forma, acentua o amor, não o conjuga bem, nem compreende o que é pronunciado.
O amor é crase que não obedece às normas; fulmina a gramática dos que conhecem o acento, mas não experimentam o fenômeno da pele. Amor em tons agudos e graves, conforme a destilação; em notas ofegantes, repetidamente ensaiadas, prolongadas no último canto de perenidade, quando o erudito e o popular se entregam ao sagrado êxtase. Triste amor, quando a crase é desfeita e cada qual dos ases volta para seu naipe, um esquecido do porre que deu no curinga, o outro mentindo para si mesmo que não gostou de ter aprendido a arte de gravear.
Preposição e artigo, unidos em forma de igualdade. O artigo, substantivo masculino, que pode ser ele ou ela, sem erro, tampouco nenhuma pornografia. A preposição, substantivo feminino, que prepucia a crase e faz as relações intensas, sem regidos nem regentes, entregues à unidade, na diversidade. Diálogos que se estabelecem entre Camões e Cervantes, na crase horizontal de céu e terra, onde os lábios de aqui se encontram com os lábios de aí.
Quatro mãos em crase, nas fogueiras que inquisicionam a solidão. Olhos em crase, mergulhados no gótico que assistiu ao nosso matrimônio. Pés em crase, na readequação dos nossos ventrículos. Primeira e segunda voz, crase polifônica de compassos geográficos distintos, sob a pausa de serras metrificadas pela liberdade de quem solfeja a palavra, ao ouvido faminto da língua. Nòs (sic!), crase em primeira pessoa, indicando um eu que sonha e um tu que desenha o acento, no tamanho da liberdade.
@gleiberdantas – Florânia, 07 de setembro de 2016.
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